A crise que atinge os países desenvolvidos é fundamentalmente fiscal. É resultado da crise financeira que abateu os mercados em 2008, e para salvar os bancos de uma quebradeira geral os governos desses países tiveram de se endividar e dar garantias para evitar corridas bancárias e tentar tranquilizar os mercados. Agora, a conta para salvar o mercado financeiro tem de ser paga pelo contribuinte, na elevação de impostos, e pela população, pela redução do emprego e das condições de vida que tinha.
O rebaixamento da nota de risco dos EUA pela Standard & Poor"s teve como justificativa o descontrole fiscal desse país. A situação dos países da Europa é também grave na questão fiscal, e há forte probabilidade de piorar, pois a terapia de apertar os cintos acaba gerando maior perda de receita do que economia de despesas. É o que vem ocorrendo, evidenciando as falsas saídas para tratar a questão fiscal.
O Brasil, felizmente, fez o dever de casa há alguns anos, produzindo economias para o pagamento de juros da dívida, o chamado superávit primário (receitas menos despesas, exclusive juros). Mas falta muita coisa que pode e deve ser feita para melhorar nossas contas públicas.
A principal delas é o crescimento das receitas, que só ocorre quando há crescimento da economia, que reduz a inadimplência e a sonegação, e a arrecadação sobe. É comum ver análises que não atentam para a importância disso. Apresentam porcentuais de crescimento das despesas e concluem o diagnóstico duvidando que se consiga atingir um superávit primário prometido pelo governo. Na questão das despesas, a principal e mais fácil de ser reduzida é a relativa a juros, que atingiu, nos últimos 12 meses até junho, R$ 222,9 bilhões, ou 5,73% do PIB. Isso ocorre pois a política do Banco Central (BC) é oferecer de presente aos aplicadores em títulos do governo as mais altas taxas de juros do mundo. Essa conta poderia ter sido zerada há muitos anos, desde que praticássemos taxas de juros compatíveis com as dos demais países emergentes que têm inflação semelhante ou até inferior à nossa.
Há males que vêm para o bem, e esse é um deles. O Brasil não só pode, como deve reduzir imediatamente essas taxas de juro, que não irá ocasionar nenhuma elevação inflacionária, pois o que comanda a inflação no mundo globalizado são os preços das commodities e alimentos, cuja tendência é claramente de queda em razão da estagnação da economia dos países ditos desenvolvidos.
Mas, para os que ainda insistem nessa tese de que a Selic controla a inflação, é bom considerar que os consumidores que compram a prazo estão sujeitos não a essa taxa Selic, mas às taxas de juros bancários, que nada têm que ver com ela, pois são mais de dez vezes maiores, como no caso do cheque especial.
A decisão do consumidor na compra é ver se a prestação cabe no seu bolso, e para isso existem as medidas macroprudenciais, que podem ser usadas para encarecer, se necessário, os empréstimos de prazos mais longos e até reduzir o ritmo de sua expansão, elevando os depósitos compulsórios dos bancos no BC e/ou aumentando a exigência de mais capital nos bancos que quiserem ampliar a oferta de crédito aos consumidores. Instrumentos não faltam ao BC para o efetivo controle da inflação. Ele é que não os usa, por incompetência ou por não querer desagradar ao mercado financeiro, que tem nas elevadas taxas Selic parte importante de seus lucros, pagos por todos nós.
Pode-se fazer mais com menos recursos, como disse a ministra Miriam Belchior. O setor público gerencia mal suas despesas, há corrupção encarecendo obras e serviços públicos, há excesso de funcionários nas funções-meio e em cargos de confiança e políticos. O aperto na liberação das despesas é importante instrumento que os órgãos de controle orçamentário podem usar. Isso induz a priorização das despesas e maior controle sobre elas. É necessário mais austeridade nas despesas, menos taxas de juros e maior crescimento econômico. São aliados e se somam para o sucesso fiscal. Resta ver se o governo saberá tirar partido disso.
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