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segunda-feira, 15 de agosto de 2011

PIRATARIA: Conceitos e Equívocos na abordagem do tema


O termo "pirataria" originariamente definia a ação praticada por pirata, sendo esse um tipo de bandido ou salteador que cruzava os mares com objetivo de roubar e pilhar coisas alheias. No presente tal palavra passou a ser utilizada, pelo senso comum, para definir o conjunto de atos ou procedimentos ilícitos, envolvendo pessoas físicas, jurídicas ou o concurso dessas, com vistas à produção, distribuição e venda de artigos, tais como: roupas, calçados, brinquedos, peças para carros, utilidades das indústrias fonográficas, cinematográficas, de informática e outras, efetuadas ao arrepio das Leis e Tratados Internacionais de proteção à propriedade intelectual e industrial.
            
Esses frutos da ilicitude passam a ocupar, na cadeia de circulação econômica, o lugar dos bens de consumo legalmente produzidos, causando sérios danos à economia nacional e transnacional, gerando a destruição dos capitais formais, a precarização do emprego da mão-de-obra e brutal perda de arrecadação dos recursos necessários á manutenção das ações estatais. 
Trata-se de fenômeno mundial agravado pela globalização da economia e pela tolerância da sua prática em países em desenvolvimento e emergentes, como exemplo cite-se a China cuja economia cresce a um decênio ao percentual médio de 9% ao ano, tendo nos estágios primários do seu desenvolvimento se especializado em produzir cópias baratas de modelos de utilidades, cujos originais já estavam consagrados pelo consumo de massa no ocidente.
Frear as atividades dos falsários na China e em outros países necessitará de esforços heróicos. Isso porque as falsificações florescem em meio ao próprio processo de globalização. Afinal de contas, a globalização é a disseminação de capital e tecnologia em novos mercados, que por seu turno contribuem com mão-de-obra barata, dessa maneira criando a máquina exportadora ideal, fabricando inicialmente coisas baratas e, com o passar do tempo, incrementando a agregação de valor. Essa é a história no Sudeste Asiático. E é a mesma história na China. Agora, a mesma trajetória é trilhada pela indústria da falsificação. Esse tipo de pirataria beneficia-se ao máximo de mão-de-obra especializada, distribuição inteligente e diferenciação mercadológica de produtos sem se deixar enredar em detalhes incômodos e onerosos como pesquisa e desenvolvimento e construção de marcas.[1]

O estudo jurídico desse fenômeno passa inicialmente pela explicitação dos conceitos científicos albergados sob o jargão popular "pirataria". Esse vocábulo encerra dois conceitos científicos muito parecidos, mas passíveis de diferenciação, conforme segue:

1) a pirataria é a atividade de copiar, reproduzir ou utilizar indevidamente, ou seja, sem a autorização expressa do autor, software, música, filme, livro ou qualquer outra obra intelectual legalmente protegida;
2) o termo contrafação[2] origina-se do latim contrafacere, que quer dizer produzir por imitação, reproduzir fraudulentamente ato ou coisa - no caso em estudo tem se a contrafação industrial. O termo se aplica à falsificação de marcas, indicação geográfica e à utilização não autorizada, na produção industrial, em qualquer escala, de desenhos, projetos, fórmulas e modelos de utilidades, registrados ou patenteados.

Disso deflui que a pirataria é uma espécie do gênero contrafação diferenciando-se da espécie do mesmo gênero, contrafação industrial, pelo produto resultante, como se pode ver a seguir:

1) os frutos da pirataria podem ser copiados do modelo originário, protegido pela Lei dos Direitos do Autor[3], por processo simples, com pouco emprego de matéria-prima e sem alterações significativas de características, mantendo o produto resultante grande similitude com a criação intelectual original [4];
2) os frutos da contrafação industrial resultam da utilização de criações ou invenções do gênio humano protegidas pela Lei do direito do autor, que foram legalmente cedidas ou vendidas pelo o original criador para empresas industriais ou comerciais, passando a ser protegidas pela Lei de Proteção à Propriedade Industrial[5] e que sem a autorização dessas empresas são utilizadas em processos de produção industrial complexos, com o emprego de diversas matérias-primas, seguidos ou não da aposição de marca protegida na imitação resultante[6] (exemplo: a cópia desautorizada do projeto industrial da moto Honda CG 125).

A indústria mundial de falsificações está fora de controle, envolvendo de tudo, de chips de computadores a medicamentos que podem salvar vidas. A coisa está tão feia que até mesmo a China pode precisar reprimir essas atividades[...].
A China é fundamental para qualquer solução. Tendo em vista que o país é um gorila econômico, as falsificações no país também são feras, correspondendo a quase dois terços de todos os produtos falsificados e pirateados em todo o mundo [...]. E os falsários chineses produzem milhões de motocicletas por ano, sendo que as cópias desautorizadas da Honda CG125 são vendidas por cerca de US$ 300, ou seja, menos de metade do preço de uma Honda verdadeira. [...]. [7]
Em virtude dos constantes equívocos conceituais verificados em matérias jornalísticas veiculadas sobre o tema e até em textos legais[8], mister se faz dirimir as dúvidas recorrentes sobre a diferenciação entre pirataria, contrafação, descaminho e contrabando.

Como visto, cientificamente, a pirataria é uma espécie do gênero contrafação, logo a conceituação de um objeto, artefato, utilidade ou coisa como sendo pirata ou contrafeito, guarda relação com a legalidade do processo de produção desses, ou seja, se essas mesmas coisas fossem produzidas respeitando os direitos à propriedade intelectual ou industrial deveriam ser denominadas de utilidades, produtos industrializados, peças, artefatos, mercadorias, etc.

Diferentemente, a classificação de objetos, artefatos, utilidades ou coisas como descaminhados ou contrabandeados guarda relação com a forma de ingresso dessas coisas em território nacional e com a existência ou não de norma proibitiva do seu livre comércio, conforme segue:

1) são consideradas descaminhadas as mercadorias integradas dolosamente ao mercado interno com o descaminho dos devidos tributos (coisas relativamente fora de comércio[9]);
2) são consideradas contrabandeadas as coisas inseridas clandestinamente na cadeia de circulação nacional e que por força de imposição legal tem a sua comercialização controlada ou vedada e a sua importação, quando possível, está restrita à esfera de determinados órgãos ou entidades da Administração Pública (coisas absolutamente fora de comércio[10]). 
"O Contrabando (Objeto Ilícito) é o ato de transportar e comercializar ilegalmente, produtos proibidos por lei no país. Um exemplo claro de contrabando são as armas e drogas que atravessam as fronteiras do país, muitas vezes junto com produtos piratas no seu carregamento. Pode acontecer também o caso de contrabando de animais silvestres. Neste caso, a retirada dos animais de seu habitat natural e sua comercialização são proibidos e o transporte é feito de maneira ilegal.
 O descaminho (Objeto Lícito) corresponde, muitas vezes, ao crime de sonegação fiscal. Ocorre quando há a entrada ou saída de produtos permitidos no país sem que os mesmos recolham impostos ou sejam submetidos aos trâmites burocráticos necessários nessas operações. Diferentemente do contrabando, o crime de descaminho pode ser sanado com o devido pagamento dos impostos pelas mercadorias importadas ou exportadas"
Disso decorre que esses conceitos podem, em tese, coexistir em um mesmo artefato ou coisa, admitindo-se a possibilidade da existência de produtos piratas descaminhados ou piratas contrabandeados[13] e, Igualmente, a possibilidade da existência de produtos contrafeitos descaminhados e contrafeitos contrabandeados[14].

Outro ponto que merece relevo é o estudo da competência estatal para reprimir a pirataria e a contrafação. Nesse diapasão há que se ressalvar que grande parte dos produtos ditos "piratas" tem origem nacional, disso decorre a existência de competências exclusivas e concorrentes, delegadas aos agentes públicos a serviço da União, dos Estados Membros, do Distrito Federal e dos Municípios para atuarem na tributação e repressão à produção e circulação econômica desses produtos, como se pode ver adiante:

Assim, cabe à União, representada pela Secretaria da Receita Federal atuando nas zonas aduaneiras primária e secundária, como autoridade aduaneira, aplicar a pena de perdimento desses objetos frutos de pirataria e de contrafação, tão somente quando de origem comprovadamente estrangeira, consoante inciso VIII do artigo 689 do Decreto n. 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro).

Fonte : Revista Jurídica NETLEGIS 
 Dados sobre o autor:
» Nome completo: Hélio Sabino de Sá
» Profissão e qualificações: Servidor Público
» E-mail: Heliosabinosa@gmail.com



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